Na quarta reunião da série de audiências públicas que a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados promove sobre a reforma administrativa (PEC 32/20), o tema voltou a dividir opiniões nesta segunda-feira (3) entre palestrantes e deputados.
Por um lado, os defensores da reforma argumentam que a proposta garantirá um Estado mais moderno e eficiente. Por outro lado, os contrários acreditam que o texto precariza o serviço público, e o coloca a serviço de quem estiver no poder.
A proposta de reforma administrativa enviada pelo Executivo ao Congresso Nacional restringe a estabilidade no serviço público e cria cinco tipos de vínculos com o Estado. Essas mudanças valerão para os novos servidores. O texto estabelece que leis complementares tratarão de temas como política de remuneração, ocupação de cargos de liderança e assessoramento, progressão e promoção funcionais e definição das chamadas “carreiras típicas de Estado”.
Conheça a proposta do governo para a reforma administrativa
Prefeituras
A consultora jurídica da Confederação Nacional de Municípios (CNM), Elena Garrido, afirmou que as cidades vinculadas à confederação se colocam a favor de “uma reforma administrativa que seja capaz de modernizar o Estado”. Segundo ela, os prefeitos aguardam a reforma há muito tempo, e o cidadão reclama de pagar uma alta contribuição e ter em troca um serviço público “ineficiente e precário” que, de acordo com Garrido, decorre do engessamento dos orçamentos dos governos locais, aplicados especialmente em folha de pagamento.
Segundo ela, o movimento municipalista, representado pela CNM, quer ver a redação do artigo 37, que trata da administração pública, instituindo regras que possibilitem claramente, por exemplo, a contratação de servidores por prazo determinado, para o atendimento de políticas públicas de outras esferas de poder.
“Os municípios acabam sendo compelidos a admitir pessoal em seus quadros, com concurso público, para execução de atividades que não têm nem sequer a segurança de que terão a devida continuidade, já que os programas governamentais mudam a cada governo”, afirmou Elena Garrido.
Ataque aos direitos
O coordenador de Formação e Organização Sindical da Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União, Thiago Duarte Gonçalves, por outro lado, disse que, pelo que conseguiu levantar, nenhum outro governo está usando a pandemia para passar uma reforma de Estado. Ele defende que esse não é o momento adequado para a discussão.
Gonçalves também ressaltou que o texto ataca direitos de servidores atuais, como por exemplo férias de professores, e a possibilidade de extinção de cargos pelo presidente; e não ataca pontos como salários extrateto e nepotismo. Para ele, a PEC é inconstitucional.
“É uma PEC que, do ponto de vista constitucional, ataca, a título meramente exemplificativo, os princípios da impessoalidade e da moralidade ao relativizar ou mesmo deixar como exceção o concurso público e a estabilidade. A gente sabe quais são os objetivos estratégicos de quem fez isso: é substituir as pessoas que respeitam a lei, respeitam a Constituição, e colocar as indicações. Entre os servidores, a PEC é conhecida, infelizmente, como PEC da rachadinha.”
Já Ademar Batista Pereira, presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares, defendeu que o momento é propício para este debate.
“Essa reforma é absolutamente pertinente. O Brasil vive a maior crise econômica da história. E não é o Brasil, é o mundo. A pandemia causou um impacto monstruoso no mundo todo. E muitas atividades econômicas estão paradas no Brasil. Reformar o Estado nós já devíamos ter feito há 20 anos. Nós não fizemos, e agora é a hora.”
Para o deputado Alencar Santana Braga (PT-SP), a reforma fragiliza o serviço público.
“Esse modelo que eles querem é justamente o do Estado frágil, do Estado omisso, que não consegue prestar o serviço. Nesse modelo que aí está, a gente coloca o conjunto do Estado brasileiro numa posição muito frágil e com possibilidade de cooptação pelo setor privado”, disse.
A CCJ não avalia o mérito, ou seja, o conteúdo da proposta, e sim aspectos técnicos, como, por exemplo, se o texto está de acordo com a Constituição Federal. Depois de passar pelo colegiado, a reforma administrativa ainda precisa ser analisada por uma comissão especial e pelo Plenário, em dois turnos de votação.
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