Parlamentares e convidados rechaçaram qualquer espécie de tributação sobre os livros ao debater nesta segunda-feira (26), na Comissão de Educação, um projeto do Poder Executivo (PL 3887/20) em análise na Câmara dos Deputados.
Desde a Constituição de 1946, por iniciativa do escritor e na época deputado constituinte Jorge Amado (1912-2001), os livros são imunes a impostos no Brasil. Em 2004 também se tornaram isentos de algumas contribuições sociais.
Benefício fiscal para livros somou cerca de R$ 9 bilhões em 13 anos
A equipe econômica incluiu, em documento recém-divulgado, os livros entre itens sujeitos à incidência da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), primeira etapa de uma reforma tributária a ser desenvolvida no governo Bolsonaro.
A deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS), mediadora do debate nesta manhã na Câmara e coordenadora da Frente Parlamentar de Incentivo à Leitura, questionou a hipótese. “O governo que isenta armas quer taxar livros?”
Desde que surgiu o documento do Ministério da Economia, um abaixo-assinado on-line reuniu mais de 1,4 milhão de apoiadores contra a taxação de livros, disse a estudante Julia Marina Bortolani Martins, coorganizadora do movimento.
Explicações
Na reunião, coube à Receita Federal – a partir do subsecretário de Tributação e Contencioso, Sandro de Vargas Serpa, e do coordenador-geral de Tributação, Fernando Mombelli – defender as ideias da equipe econômica, que, para a deputada Fernanda Melchionna, poderiam ser resumidas na frase: “só rico lê”.
O argumento básico do governo é que a proposta seria neutra – não acarretaria aumento ou queda na arrecadação. Haveria a cobrança do tributo para as faixas de renda mais ricas, e os eventuais recursos obtidos com a CBS sobre os livros poderiam beneficiar os mais pobres mediante políticas públicas direcionadas.
Julia Martins, ex-aluna da rede pública, revelou ceticismo com essa ideia ao citar professor que pedia doações de livros didáticos – cuja oferta hoje é dever do Estado, destacou. “Em vez de taxar, o governo deveria diminuir o preço dos livros”, afirmou. “Tenho o direito de escolher o que quero ler.”
Já o presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, Marcos da Veiga Pereira, rebateu tese da equipe econômica de que a isenção não trouxe efeitos no mercado de livros. Pesquisas mostram que o preço médio real (descontada a inflação) recuou 34% de 2006 a 2011, tendo oscilado muito pouco até 2019.
“Famílias com renda inferior a dez salários mínimos respondem por 50% do consumo de livros não-didáticos e cerca de 70% dos didáticos”, disse Fernanda Melchionna, coautora do pedido para realização da audiência pública. “É evidente que devemos ampliar o acesso, e não restringi-lo, como o governo ameaça fazer.”
Ao final, o subsecretário Sandro Serpa ressaltou que a reforma tributária ainda está em discussão, colocando-se à disposição para futuras reuniões – o que foi aceito por Melchionna. “A proposta (PL 3887/20) mexe com mais de cem regimes especiais, teremos enorme prazer em debater”, disse Serpa.
Outros participantes
O debate realizado pela Comissão de Educação nesta segunda-feira foi promovido com o apoio dos deputados do Psol Sâmia Bomfim (SP), Glauber Braga (RJ) e Ivan Valente (SP). A videoconferência nesta manhã também contou com a presença dos deputados Angela Amim (PP-SC) e Bira do Pindaré (PSB-MA).
Participaram ainda da audiência pública a coordenadora-geral dos Programas do Livro do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Nadja Cezar Ianzer Rodrigues; o presidente do Conselho Federal de Biblioteconomia, Marcos Luiz Cavalcanti de Miranda; a diretora-executiva da plataforma de abaixo-assinados Change.org, Monica Adriano de Souza; e a representante da Rede Nacional de Bibliotecas Comunitárias Viviane Henrique Peixoto.