Notícia-crime aponta o líder religioso da Igreja Mundial do Poder de Deus como possível praticante de estelionato mediante uso de elementos religiosos
O Ministério Público Federal (MPF) – por meio da Procuradoria Regional da República da 5ª Região, no Recife (PE) – enviou notícia-crime ao Ministério Público do estado de São Paulo (MP/SP) pedindo que apure possível prática de estelionato por parte de Valdemiro Santiago de Oliveira, líder da Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD). Em vídeo divulgado em diversas páginas da internet, o pastor aparece anunciando sementes de feijão com supostos poderes de curar a covid-19.
Valdemiro Santiago não fala explicitamente em pagamento, pois emprega a palavra-código “propósito” (as vítimas não fariam pagamentos, mas “propósitos”). Porém, apesar do disfarce linguístico, o intuito está claro: os fiéis devem pagar valores predeterminados para obter feijões mágicos que poderão curá-los da covid-19, mesmo em casos graves. Não basta ter fé nem ser seguidor do líder religioso, pois não há a possibilidade de fiéis sem condições econômicas receberem o produto. As sementes só serão entregues àqueles que exibirem comprovante de pagamento.
Para o MPF, está claro o uso de influência religiosa e da mística da religião para obter vantagem pessoal (ou em benefício da IMPD), induzindo vítimas em erro, pois não há evidência conhecida de cura da Covid-19 por meio de alguma divindade nem por ingestão ou plantação de feijões mágicos. Segundo a comunicação, o pastor praticamente debocha da boa-fé de seus seguidores, informando que as sementes germinarão e na planta estará escrito “Sê tu uma bênção” – que é o slogan místico-publicitário da organização religiosa.
O procurador regional da República Wellington Cabral Saraiva, autor da notícia-crime, destaca que nas denominações cristãs – tradição em que se insere a IMPD –, o mercantilismo religioso sempre foi prática reprovável. “Negociar favores espirituais parece incompatível com a afiliação religiosa com a qual o noticiado Valdemiro Santiago aparentemente se identifica”, diz o procurador.
O MPF esclarece que não se pretende interferir na liberdade religiosa (assegurada pela Constituição da República) nem criminalizar a contribuição econômica de fiéis para a igreja, pois elas têm despesas que precisam ser custeadas. Porém, não se pode, a título de liberdade religiosa, permitir que indivíduos inescrupulosos ludibriem pessoas vulneráveis e firam a fé pública. “Não se trata de coibir as pessoas em geral de professar a fé que desejarem e de cultuar as divindades de sua preferência, na forma de sua escolha. Trata-se de impedir que determinados indivíduos se valham desse conjunto de crenças para obter vantagem econômica ilegítima, valendo-se da crendice alheia, mediante sofisticados esquemas publicitários, psicológicos e tecnológicos”, diz a notícia-crime.
Wellington Saraiva ressalta que o pastor se tornaria personalidade mundial se realmente pudesse ou soubesse como prevenir ou curar casos da infecção pelo novo coronavírus. “Se ele não fosse líder religioso interessado apenas em obter dinheiro de vítimas incautas, ofereceria essa solução não apenas àqueles que pudessem lhe pagar, mas a toda a humanidade. Nisso estaria passo importante da religação entre o homem e suas divindades, que caracteriza as religiões”, declarou.
MPSP
A notícia-crime foi enviada ao Ministério Público estadual porque o crime a ser investigado é de competência da Justiça Estadual, e o MPF atua perante a Justiça Federal. A apuração deverá ser feita pelo MPSP, pelo fato de a sede da IMPD situar-se em São Paulo.
No vídeo, Valdemiro Santigo – denominado apóstolo na sua igreja – diz que cada grão de feijão pode custar R$ 1 mil, R$ 500, R$ 200 ou R$ 100, dependendo a situação financeira dos fiéis. (Com informações do MPF)